5.9.09

Falta

Hoje abri o meu Baú, este mesmo, e a música começou a tocar.

You raise me up, so I can stand on mountains;
You raise me up, to walk on stormy seas;
I am strong, when I am on your shoulders;
You raise me up….To more than I can be.


Há muito tempo que aguentava as lágrimas que tinham que acabar por sair... Hoje, especialmente. Hoje que te perdemos há nove anos, prima. Hoje, que estou na casa onde nasceste, cresceste e viveste tantos anos, e pergunto o que o futuro me reserva. Eras tão cheia de vida, infeliz, talvez, sozinha, mas cheia de vida. Hoje, a porta do teu quarto esteve aberta. Permanece como sempre o conheci desde pequena, com as bonecas que animaram a tua infância e que achava lindas. Agora olho para elas e vejo apenas destroços de um passado feliz que não volta mais. Fazes falta. Muita, a muita gente que ainda chora por ti e nunca se esquece de como a doença pode ser tão cruel e destruir-nos os sonhos.
Hoje vi-te. Há muitas semanas que não ia a tua casa, não me perguntes porquê, avó Maria. Há respostas que temos, mas que são para ficar connosco enquanto puderem ser nossas. Quando ouvi a tua voz e te vi aparecer apeteceu-me fugir. Sim, eu sei que parece cruel, mas pela primeira vez apeteceu-me fugir. Não te olhar nos olhos quando me perguntas pela vida, não ver como estás tão velha, avó!... A pele dos braços e das mãos tão velha... A voz a tremer. A cara abatida. A bengala onde te apoias para fazer o que ainda te vai dando ânimo e... esperança? Talvez. Nisso és como o meu avô Grilo, não queres morrer, eu sei. Ouvi-te muitas vezes dizer, tal como ele "eu sei que temos que morrer, mas eu cá não queria, se pudesse vivia sempre!". E rias-te muito, como sempre fazes quando achas que dizes uma coisa disparatada. Não é, avó. Eu penso o mesmo, sabes? Não queria morrer nunca, mas mais do que isso, não queria que vocês morressem nunca. Olho para ti, hoje, e percebo que a vida passa depressa demais, que perdemos depressa demais os que mais amamos e os que nos "levantam". A música do meu Baú continua a tocar e lembro-me daquele que mais me animava e fazia feliz. O meu avô. Tristeza? Melancolia? Não, apenas saudade, muita saudade, daquela que aperta o peito e faz as lágrimas caírem assim...

8 comentários:

Ana disse...

Sabes, na escola explicamos aos meninos que na natureza tudo tem um ciclo: Nascemos, vivemos, temos as nossas flores, damos os nossos frutos e depois "caimos de mansinho como as árvores".
- Normalmente os meus comentários nao aparecem no blog, ou nao são aprovados..espero que pelo menos os consigas ler.
- Li, como faço com os outros posts, este com especial atençao. Sinto o mesmo quando olho para a minha avó Monteira! Às vezes, quando me deito na cama e não tenho sono, penso que..."ela já é tão velhinha"...afinal, já são 92 anos...
Ela está bem de saúde. Apesar de a morte do meu avô a ter "jogado" ao chão, ela levantou-se e vai levando a vida com a genica que sempre a caracterizou. Eu sei que, algum dia, os anjinhos a virão buscar. É nesso momento que ajeito a almofada, viro-me para o outro lado e penso: vamos pensar noutra coisa Ana! Quando chegar a altura, logo se vê!
Às vezes, quando os pensamentos são mais fortes ou o sono está ainda muito distante, vou buscar lembranças do "meu bau". Recordo me daquelas mãos a amassar broa, a partir lenha...uma vez com a pedoa, até lhe cortei a perna!! Andava sempre com eles, a minha vobis (como lhe chamo) e o meu abô - que a malta de Condeixa tem a mania de trocar os /v/!
...Sabes que não estás sozinha nos teus pensamentos não sabes? Sabes que há dores só tuas...mas há outras que também são sentidas pelos teus próximos.

Hoje apetecia-me falar...conversar como tu dizes. E tal como tu venho para aqui sentar-me estupidamente à frente dum computador...
Se mudares de ideias...vamos comer um gelado.

Um beijinho* com amizade - apesar de ser cruel contigo às vezes...acho que há algo que...é bem semelhante em nós.

Adoro te...

e

Tenho saudades tuas...

(lágrimas...são apenas água)

Anónimo disse...

Principessa, por coicidência também eu entrei no domingo, pela primeira vez em cinco anos, no apartamento onde a minha prima viveu e onde também tinha os seus brinquedos de infância e recordações da adolescência. Revivi um passado recente mas tão distante... tão inatingivel! Como eu a entendo... estou a sentir-lhe as lágrimas, pois são irmãs das minhas... Boa noite, desde domingo, parece que hoje alguém me entendeu. beijinhos e não deixe de olhar as estrelas...

Mafalda Branco disse...

Querida Aninhas,
como te disse, não tenho recebido... Sabes que te respondo sempre. Ando afastada, eu sei, mas espero que compreendas que agora tem mesmo que ser. Brevemente conversaremos e, quem sabe, choraremos... ou então sorriremos, como nos bons tempos! :)
Também te adoro e tenho saudades tuas!

Mafalda Branco disse...

Querida L.E.,
há um laço invisível que nos une, e é nestes momentos que essa união é mais forte.
Um abraço forte e amigo, que foi o que ontem também precisei...

Ana disse...

Andamos todos a precisar de abraços infindáveis...
O que se passa com o "mundo ao contrário"...

Maggie disse...

Mafalda,

percebo um pouco o que tu dizes. A minha avó era uma luz na minha vida e fez, agora em final de Agosto, 2 anos que partiu. Chamava-se Vitória e era, como o seu nome, uma lutadora, mas muito muito carinhosa, sempre com sorriso e um mimo para dar. Ainda agora, ao escrever isto, caem-me as lágrimas. A angústia vai diminuindo, mas não a saudade... essa passa a fazer parte de nós. Se calhar é assim, a imortalidade... através dos que nos recordam, com saudade.

Um grande beijo para ti.

Mafalda Branco disse...

Olá Maggie!
Concordo contigo. Acho que continuamos a viver através dos que nos amam e nos recordam sempre. E temos muita sorte por termos (ou termos tido) avós assim, exemplos de vida, fortes e especiais nos afectos. Sem dúvida que isso nos marca para sempre e faz de nós o que somos hoje.
Um beijo grande...

Anónimo disse...

And death shall have no dominion (by Dylan Thomas)

( http://www.youtube.com/watch?v=niY3j_xOzGc )

And death shall have no dominion.
Dead men naked they shall be one
With the man in the wind and the west moon;
When their bones are picked clean and the clean bones gone,
They shall have stars at elbow and foot;
Though they go mad they shall be sane,
Though they sink through the sea they shall rise again;
Though lovers be lost love shall not;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
Under the windings of the sea
They lying long shall not die windily;
Twisting on racks when sinews give way,
Strapped to a wheel, yet they shall not break;
Faith in their hands shall snap in two,
And the unicorn evils run them through;
Split all ends up they shan't crack;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
No more may gulls cry at their ears
Or waves break loud on the seashores;
Where blew a flower may a flower no more
Lift its head to the blows of the rain;
Though they be mad and dead as nails,
Heads of the characters hammer through daisies;
Break in the sun till the sun breaks down,
And death shall have no dominion.


For our Grandfathers,
Ducic ~