
O meu avô, conhecendo o meu encantamento por estes bichos, às vezes apanhava um e punha-o dentro de uma lata. Chamava-me depois, sempre com um sorriso maroto, e retirava a tampa com muito jeitinho. Eu tinha sempre medo que fosse alguma partida e que de dentro da lata saísse algum animal que me deixasse aterrorizada... Mas a alegria dele era ver a minha cara, primeiro receosa, depois a abrir-se num sorriso, com os olhos a brilhar, e fascinada a observar aquele animal, aparentemente tão dócil. No entanto, mal o meu avô lhe tocava ao de leve com um pau, o ouriço enrolava-se numa bola perfeita, abrindo os seus espinhos, que luziam imponentes, numa reacção simultânea de protecção e de ataque. Eram sempre momentos deliciosos, em que o mundo à minha volta parecia parar e mesmo agora que os recordo, continuam a ter o mesmo poder de me deixar suspensa no tempo.
Sinto-me como um ouriço neste momento. Ao mínimo toque, enrolo-me sobre mim própria e mostro os espinhos, naquilo a que os psicólogos, como eu, chamam de reacção de defesa... Não gosto de me sentir assim, não quero ser assim. Dos ouriços quero apenas conservar a memória feliz dos tempos de criança e de adolescente, quero apenas continuar a desviar-me para os deixar seguir, tranquilamente, o seu caminho. Quero recolher os espinhos e voltar a sorrir, sem medo e sem mágoas. Quando, não sei...
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