23.8.09

O SILÊNCIO


Pego num pedaço de silêncio. Parto-o ao meio,
e vejo saírem de dentro dele as palavras que
ficaram por dizer. Umas, meto-as num frasco
com o álcool da memória, para que se transformem num licor de remorso; outras,
guardo-as na cabeça para as dizer, um dia,
a quem perguntar o que significam.
Mas o silêncio de onde as palavras saíram
volta a espalhar-se sobre elas. Bebo o licor
do remorso; e tiro da cabeça as outras palavras
que lá ficaram, até o ruído desaparecer, e só
o silêncio ficar, inteiro, sem nada por dentro.


Nuno Júdice, in A Matéria do Poema

1 comentário:

joana disse...

Muito bonito.
Bjo