28.9.09

Sinto-me

POEMA DAS ÁRVORES

As árvores crescem sós. E a sós florescem.

Começam por ser nada. Pouco a pouco
se levantam do chão, se alteiam palmo a palmo.

Crescendo deitam ramos, e os ramos outros ramos,
e deles nascem folhas, e as folhas multiplicam-se.

Depois, por entre as folhas, vão-se esboçando as flores,
e então crescem as flores, e as flores produzem frutos,
e os frutos dão sementes,
e as sementes preparam novas árvores.

E tudo sempre a sós, a sós consigo mesmas.
Sem verem, sem ouvirem, sem falarem
Sós.
De dia e de noite.
Sempre sós.

Os animais são outra coisa.
Contactam-se, penetram-se, trespassam-se,
fazem amor e ódio, e vão à vida
como se nada fosse.

As árvores não.
Solitárias, as árvores,
exauram terra e sol silenciosamente.
Não pensam, não suspiram, não se queixam.
Estendem os braços como se implorassem;
com o vento soltam ais como se suspirassem;
e gemem, mas a queixa não é sua.

Sós, sempre sós.
Nas planícies, nos montes, nas florestas,
a crescer e a florir sem consciência.

Virtude vegetal viver a sós
E entretanto dar flores.


António Gedeão, in "Poemas Escolhidos"

Escultura: Mulher-Árvore, Luís Laroche

3 comentários:

Anabela dos Santos Luís disse...

As árvores são amor puro, na sua mais nobre expressão. O seu altruismo consciente não é solidão...
Um beijo para a minha árvore em crescimento :)

Anónimo disse...

As árvores... não poderia ter encontrado espelho melhor... mire-se a ele todos os dias!
Já brilham estrelas no céu!


ps. I´m singing in the rain
just singing in the rain
what a glorious feeling
I´m happy again
tam tam tamram tamtam...
venha cá fora e sinta o cheiro.

Mafalda Branco disse...

Obrigada às duas pelo carinho... :)
Um beijo especial!